Um pedaço de mim...
Como todas as boas mães deste mundo, também eu tenho, muitas vezes, dúvidas sobre se estarei, de facto, a ser uma boa mãe.
Sempre que sou assolada com estas dúvidas, recuo uns anos e recordo momentos da minha vida, no meu papel de filha. Recordo momentos, pelos quais passei e que hoje me ajudam a ser melhor.
Recordo-me que era ainda uma garota, a idade rondaria os cinco e, naquela noite, acordei de um pesadelo, bastante assustada. O quarto estava escuro e tive de esperar uns segundos para me habituar e conseguir ver. Levantei-me, desci as escadas do beliche, dirigi-me à cama deles e parei.
Os meus pequenos pés pisavam o tapete de lã, azul escuro, que estava à beira da cama. Deitada, do lado mais próximo da porta, lá estava ela. Dormia virada para mim, com as mãos na almofada e a roupa da cama subia e descia enquanto respirava profundamente.
Baixei-me e senti os joelhos pousarem na suavidade do tapete, e cruzei os pés. A lã aqueceu-me as pernas e o conforto anunciava o momento.
"Mãe." - chamei baixinho.
Sabia que assim não iria conseguir acorda-la, mas não queria acordar o meu pai... Tentei uma segunda vez, um pouco mais alto
"Mãe." - nada! O frio percorria-me o corpo. Tinha da acorda-la, ou ficaria ali, o resto da noite.
Levantei o braço e pousei a mão sobre o seu ombro que, tapado pela roupa, estava quente. Abanei-a ligeiramente enquanto a chamava
"Mãe!" - sem sucesso. O tempo passava e eu estava cada vez com mais sono e frio. Eu só queria dormir... O desespero começava a instalar-se. Abanei-a com as duas mãos e comecei a chama-la mais alto.
"Mããeee! Mããeee!" - as lágrimas começaram a cair-me pelo rosto. Os dentes batiam do frio e as mãos estavam geladas. - "Mããeee! Por favor, acorda!" - dizia entre soluços.
Não sei quanto tempo estive ao seu lado, a abana-la e a pedir-lhe que acordasse, mas sei que, naquele tempo, foi muito.
"O que é que queres?" - perguntou-me, quando finalmente acordou.
"Deixa-me dormir aqui ao teu lado."
"Aqui não cabes... Vai para a tua cama dormir!"
O meu coração partiu-se, com aquelas palavras... E eu fiquei ali, a chorar, enquanto a olhava.
"Vem-te deitar deste lado. Cabes aqui." - era o meu pai. Não sei há quanto tempo estaria acordado, mas na altura nem pensei nisso. Apenas sei que se chegou para o meio da cama, tapou-me com os lençóis e deixou-me dormir.