A política do "Posso ficar a dever-lhe um cêntimo?"
Pode um cêntimo fazer diferença? Bem... depende da situação.
Imaginemos, então, as seguintes duas situações:
SITUAÇÃO A:
Vamos a uma daquelas grandes cadeias de lojas, quase sempre multinacionais, fazemos as compras calmamente e, quando vamos pagar, ouvimos do outro lado "posso ficar a dever-lhe cêntimo?". Por norma todos respondemos que sim, afinal um cêntimo não vale nada.
Também eu aceitava, sem hesitação, que me ficassem a dever um cêntimo... até que:
SITUAÇÃO B:
Vamos a uma daquelas grandes cadeias de lojas, quase sempre multinacionais, fazemos as compras calmamente e, quando vamos pagar, percebemos que nos falta um cêntimo. Como é lógico, perguntei à pessoa da caixa "posso ficar a dever-lhe cêntimo?", e qual não foi o meu espanto quando me responderam que não e fui obrigada a deixar um produto para trás.
Não gostei! Fiquei furibunda! Só me apeteceu pedir o livro de reclamações, mas não o fiz. Comecei a magicar o meu próximo passo. Não perdiam pela demora!
Foi então que aconteceu o impensável (não para mim, que tinha tudo bem pensado), que deu origem a uma terceira situação:
SITUAÇÃO C:
Vamos a uma daquelas grandes cadeias de lojas, quase sempre multinacionais, fazemos as compras calmamente e, quando vamos pagar, ouvimos do outro lado "posso ficar a dever-lhe cêntimo?" - E foi aqui que a coisa aconteceu!!! - Muito calmamente, respondi "Não!" - e a expressão da pessoa foi indescritível e inesquecível!, mas continuei - "Na semana passada estive aqui e ficaram a dever-me um cêntimo. Ainda agora vi que ficou a dever um cêntimo à pessoa anterior, por isso, não pode!" - e aqui a pessoa mudou, literalmente, de côr - "Consegue perceber o exorbitante lucro desta cadeia, apenas por ficarem a dever um cêntimo aos seus clientes?" - neste momento a pessoa da caixa começou a olhar para todos os lados e os poucos clientes que se encontravam na loja começavam a perceber o que se passava - decidi que iria dar a conversa por terminada, dizendo "a partir do momento em que me negaram igualdade, ao não me deixarem ficar a dever um cêntimo, a minha atitude passa, então, a ser igual à vossa" e pedi que me escrevesse no verso do talão que me ficava a dever um cêntimo, para que fosse descontado na próxima conta.
E não é que a pessoa da caixa se recusou a fazê-lo?!
Apesar de me ter saltado a tampa e estar em ebulição por dentro, mantive a calma aparente e pedi para chamar o responsável da loja. A pessoa recusou. Já a bater o pé e de braços cruzados, pedi o livro de reclamações. Nova recusa. Comecei a gesticular e a dizer que iria chamar a polícia porque assim já estávamos a falar de um roubo - opá, tinha dito a palavra mágica "Polícia"! a sua atitude mudou completamente - levantou-se da cadeira (acho que, no meio de tanta conversa, se terá sentido sem forças e sentou-se) e foi chamar o responsável.
Respirei fundo, para me acalmar, e quando o responsável me perguntou o que se estava a passar contei tudo, muito calmamente - bem, escusado será dizer que, neste momento todos os clientes da loja estavam ao meu lado e a apoiar-me - inclusive a parte de chamar a polícia. O responsável, muito prontamente (e acrescento, acertadamente) escolheu a opção de escrever no verso do talão que me ficava a dever um cêntimo.
Desde este dia, nunca mais aceitei que me ficassem a dever um cêntimo. É escandaloso o que certas empresas chegam a ganhar com esta atitude.*
*penso que não existem estudos sobre os lucros ganhos com a história de ficarem a dever um cêntimo aos seus clientes, mas deduzo que seja mesmo muito.